Com conta, peso e medida. Estava tudo lá.
Mas um dia, tudo foi-se. Até certo dia.
Entrou, não bateu à porta, nem descalçou os sapatos elameados, subiu as escadas, e foi ter ao sítio do costume, onde saberia que eu iria estar. Nem sequer se preocupou com a desarrumação que estava no quarto. Viu-me, de costas, pois eu estava a fazer qualquer coisa que não a pensar nela. Aproximou-se, pôs a sua mão sobre o meu ombro e disse, num tom mansinho, que precisava de mim. Eu não respondi.
E aí uma vaga de silêncio invadiu aquele espaço amplo e, embora desarrumado, vazio.
Não sei como, reparou nos arranhões e feridas que tinha: Perguntou-me o que se tinha passado. Eu apenas consegui esboçar um sorriso irónico, enquanto ela ia vendo todas aquelas feridas.
Mas ainda que ferido, os pensos rápidos daquela marca chamada "Orgulho" íam tapando a gravidade do assunto.
Ela, mais uma vez sem pedir autorização, arrancou-os e, depois de exposta a ferida, reparou que era ainda mais sério o assunto. ( Ainda bem, assim escusava de romper o meu silêncio )
Pediu desculpa, sabendo que a culpa era sua. Eu cerrei os dentes.
Ela argumentou dizendo que errar é humano. Eu pensei: " Humano é amar ". E no fundo estavamos os dois certos, não é grande a diferença entre um e outro.
Pedi-lhe para abandonar a sala. Ela, finalmente, respeitou. Depois disso, passei horas sozinho. A pensar nela.
Mas os pensos rápidos já não estavam lá, e aquelas horas pareceram dias. Levantei-me, abri a porta, e lá estava ela, à minha espera, como se soubesse que eu iria escolher a porta para sair, em vez da janela.
Falamos. E ao fim de um tempo chegamos ao acordo que a palavra-chave era dita Devagar. E assim foi.
Mas ao que parece a indiferença atropelou tudo isto, e eu fui levado no meio.
Recordo o acidente, claramente. Hoje estou bem, mas amanhã é outro dia... Ou só mais um.
Toda a gente já errou. Toda a gente já amou.
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